O peso dos intangíveis nas combinações de negócios

Pesquisa mapeia ativos intangíveis reconhecidos de companhias de 13 setores e aponta desafios na contabilização em processos de combinações de negócios

Fonte: Revista ANEFAC | julho-agosto

Em abril desse ano a General Eletrics fez uma proposta de compra à Alstom em valor superior a US$ 13 bilhões, 25% a mais que o valor de mercado da empresa francesa, comprovando o peso dos ativos intangíveis em operações de fusões, aquisições e incorporações. A mensuração desses ativos é um desafio, pois há um gap de diferença no entendimento do mercado brasileiro sobre o que determinada empresa enxerga ou não como ativo intangível. Nesses tipos de operações, é requerido, para fins de reporte financeiro, que os adquirentes mensurem os ativos tangíveis e intangíveis a valores justos na data da transação, no entanto, as práticas internacionais demonstram que é preciso fazer um trabalho prévio de identificação dos intangíveis.

“Em empresas dos Estados Unidos, Japão e da Europa há uma preocupação muito grande com a avaliação de ativos intangíveis. Aqui no Brasil, infelizmente, esse é um assunto relegado a segundo plano e as empresas realizam PPA (Purchase Price Allocation) somente no final da transação”, afirmou Kenzo Otsuka, diretor da Mazars, durante café da manhã sobre o tema CPC 15 – Principais ativos intangíveis reconhecidos em combinações de negócios por empresas listadas na Bovespa, realizado pela ANEFAC no dia 7 de maio em São Paulo e replicado no dia seguinte no Rio de Janeiro.

Enquanto no Brasil 90% das empresas deixam para fazer PPA no final da operação de aquisição, fusão ou incorporação, no exterior as empresas têm o hábito de realizar o trabalho de PPA já no início da operação. O PPA caracteriza-se pelo processo de alocação da diferença entre o valor de aquisição de uma empresa e seu valor contábil em ativos e passivos identificáveis da companhia adquirida. Isso implica na alocação entre ativos intangíveis (como contratos, patentes, marcas, carteira de clientes, força de trabalho, etc.) e ativos tangíveis (como terrenos, edificações, equipamentos, etc.). O valor não alocado resultante é definido como goodwill, também conhecido como mais-valia, ou compra vantajosa, caso seja identificada a menos-valia.
Segundo o executivo da Mazars, é comum que a questão dos intangíveis conste no memorando interno de decisão da aquisição de empresas do exterior, ou seja, realiza-se um estudo interno para justificar a aquisição, no qual são inseridas informações sobre a identificação prévia dos ativos intangíveis. “É um movimento de transparência com o investidor e até mesmo para evitar surpresas”, acrescentou Otsuka.

A divisão Brasil da Mazars, organização internacional especializada em auditoria, contabilidade, assessoria fiscal e consultoria, analisou as demonstrações financeiras dos anos de 2012 e 2013 de 228 companhias listadas na BM&FBOVESPA (totalizando 13 setores) para identificar quais são os ativos intangíveis reconhecidos por essas empresas em combinações de negócios.

O critério utilizado para a escolha das empresas analisadas foi a inserção nos segmentos especiais de listagem da BM&FBOVESPA, além de empresas com valor de mercado acima de R$ 1 bilhão. Destacando que este tipo de pesquisa não é comum no Brasil, Kenzo Otsuka informou que o estudo ajudará a entender a realidade das empresas brasileiras. Embora os setores tenham características similares, ele acredita que cada mercado apresenta peculiaridades.
“Focamos na divulgação de informações sobre combinações de negócios e também analisamos os saldos contábeis registrados como intangíveis para corroborar a tendência de alguns setores para determinado tipo de intangível”, explicou Fabio Luiz Pecequilo, diretor da Mazars. De acordo com o “IFRS 3 – Combinações de Negócios”, os ativos intangíveis podem ser agrupados em cinco categorias: relacionados a clientes, mercado, contratos, tecnologias e artes. Pecequilo esclareceu que muitas vezes um intangível possui mais de uma nomenclatura. “Na pesquisa encontramos 95 ativos intangíveis diferentes, provavelmente alguns são a mesma coisa, mas com nomes diferentes”, relatou.

Desde 2010 as combinações de negócios realizadas no Brasil têm sido alvo de discussão pelo Fisco, e boa parte do ágio proveniente dessas operações foi barrada pela Receita Federal. A pesquisa constatou a predominância do ágio e também a existência de um volume grande de empresas com ativos relacionados à direitos, como é o caso dos contratos de concessão de gás, água, energia, etc. Alguns outros setores destacaram-se nos resultados. No segmento de serviços educacionais, por exemplo, um dos riscos é a inadimplência, que segundo Kenzo Otsuka, tem na porcentagem de 20% algo considerado normal. “Já as empresas de consumo não cíclico, como alimentação, drogarias, laboratórios, têm um equilíbrio entre ágio e intangível em termos de valor”, apontou Pecequilo.

Um ponto de atenção indicado é a presença de direcionadores de valor em alguns segmentos, como é o caso de real state e de papel e celulose. Para as empresas de real estate, o direcionador de valor é o land bank (banco de terrenos) registrado no balanço, que pode eventualmente ser incorporado, vendido ou transformado em algo. Já as de papel e celulose têm como fator direcionador de valor a floresta. De acordo com Pecequilo, atualmente é necessário conhecer, avaliar e mensurar o valor de uma floresta, bem como o valor da terra onde ela está, por conta das novas normas ambientais que fazem menção a área de preservação.

Segundo os executivos, o nível de disclosure das informações prestadas pelas empresas brasileiras ainda é baixo se comparado às do exterior. “Existem empresas top de linha, mas elas são a exceção. Na média, o nível de informações divulgado é inferior ao praticado em outros mercados”, enfatizou Otsuka. No exterior, as empresas costumam divulgar a vida útil do ativo, bem como as metodologias utilizadas para avaliar o intangível. Na avaliação de Kenzo, o Brasil ainda não está nesse patamar e as empresas brasileiras ainda têm muito a amadurecer.